No meio de tanta loucura, pressa e falta de sentimento, criei um único lugar onde algo faria sentido,pelo menos para mim. Um lugar para confortar e acolher pequenas idéias e grandes sentimentos, embora a indiferença de muitos.

sábado, agosto 29, 2015

Especial de Quinta, por favor.

    Durante todas as longas manhãs da semana seguinte eu esperei, durante o tempo que pude, para que ela entrasse novamente, balançando aqueles sininhos estrategicamente colocados em cima da porta daquele café. Sentado naquele mesmo banco, de frente para a porta, tomando o mesmo café simples e lendo aquelas mesmas notícias, eu esperava ansioso por ela. O caderno de esportes era o auge de minha expectativa e nada acontecia, nem nos times de futebol, nem no sino. Às 07h30min eu me dirigia para o ponto de táxi onde um dia me atrasei por deixá-la tomar aquele carro e meu coração.
    Todos os dias, atrasado, eu aguardava aquele mesmo táxi com uma roda diferente e uma boina no motorista, que, como que de propósito, atrasava junto comigo. Após tanto tempo, eu ainda me perguntava por que ela teria sumido. – Estava me evitando? Teria ela, ao menos, me notado? - Meu fiel motorista, com os óculos abaixados, havia me perguntado sobre ela e havíamos conversado várias vezes, ao som dos limpadores virando no vidro ou do rádio tocando Sinatra. Descobri o endereço para o qual ele teria a levado, não tão diferente do meu, e isso me deixou angustiado – Deveria tê-la acompanhando.
    Após um longo dia de trabalho, voltando par casa com meu motorista amigo, resolvi que tudo seria diferente. Iria esquecer toda aquela bobagem e me convencer de que o acaso acontece bem mais vezes que o destino. Dessa vez paguei a corrida sem gorjeta, me convencendo de que agora as coisas seriam diferentes. Por dois segundos pensei direito, e resolvi que o pobre taxista não deveria ser o primeiro com quem eu deveria efetivar esse novo eu. Acrescentei o valor de sempre e um ‘boa noite’ cordial.
    Na manhã seguinte o pedido foi um expresso e nada de jornal, o acompa- nhamento ficou por conta dos cinco pãezinhos na cesta de palha que acompa- nhavam meu pedido somente às quintas. Enquanto eu me deliciava com aquela quase-meia-dúzia de maravilhosos mini-desjejuns fui obrigado a me conter e evitar o levantar de cabeça ao ouvir o sininho balançar. Duas ou três vezes não me contive e olhei, sem muita surpresa.
    Pronto para sair, deixei a conta na lista de ‘clientes a pagar’, recolhi meus poucos pertences e rumei para a porta, decidido a não me atrasar novamente. Na pressa para alcançar o primeiro táxi que passasse, esbarrei numa moça que acabara de entrar. Pedi todas as desculpas que cabiam no tempo de não me atrasar e atravessei a rua sem olhar para trás. Apanhei um carro diferente daquele de costume e ao término da determinação de meu destino pude ver aquela capa de chuva, enrolada nos braços da jovem que eu acabara de atropelar.

Será que ainda sei escrever?

Estava apenas testando e descobri que isso não é como andar de bicicleta. As rimas, mesmo na prosa, ficam distantes e sem som, a musicalidade do texto fica fora de ritmo e nem as batidas do teclado me levam a crer que ainda sei escrever.

Quem sabe uma poesia eu possa tentar
Ou será que até nisso,
Que tanto dom eu teria,
Ainda irei falhar?

Sem saber ao certo, já falhando, aos trancos e barrancos, eu fui levando esse rabisco.
Certamente não ficou a coisa mais natural do mundo, e já era de se esperar. Depois de tanto tempo apenas falando e guardando no peito, trazer aos dedos é mais difícil do que se esperava ao imaginar. E o que dirão de mim aqueles que costumavam me elogiar? Meu Deus, que ansiedade, que medo... ah, que saudade.

Enfim, após todos esses erros, vamos ver como fica esse meu desejo de voltar a errar.