Naquela poltrona tínhamos tido todo o amor que duas pessoas
podem ter, e hoje estou aqui, esperando por você. Mas você nunca vem quando eu
espero – é como se sempre quisesse me ver surpresa.
Sem lamentar-me, guardo meu livro, termino meu café e
desisto de esperar sentada com a roupa de ontem, pelo menos por hoje. Verifico
as correspondências no chão, recolho o par de meias e penso em vesti-las – está
frio. Subo as escadas pretendendo me esconder entre o edredom, porém, de repente
lembro que a cama está forrada. Desisto. Simplesmente me entrego à poltrona de
novo com a tentação de voltar a ler.
Como pude ser tão desleixada? Ele me adormeceu na poltrona e
fugiu, de novo. De novo!
Sei que ele não fez por querer, afinal, depois de tanto eu
insistir, uma hora ele cederia. Mas eu sou o elo mais fraco da corrente, ele
não deveria me ouvir, só me entender. Mas ele nunca me entende. Só faz o que eu
peço, e nunca o que eu quero. Não precisa ser tão difícil, basta seguir poucas
pistas. Pensando bem, isso é o que pode tê-lo afastado. E se eu deixar
lembretes na geladeira? Bem, não funcionaria, precisaria deixá-los no sutiã ou
na calcinha para que ele prestasse atenção. Quantos defeitos um homem precisa
ter para ser perfeito, afinal?
E não é que o maldito foi e deixou o chuveiro aberto? Ou
estou ficando louca?
Subo os degraus enquanto o barulho aumenta e minha raiva
conjuntamente. Sou forçada a abrir a porta entreaberta do banheiro e encarar a
fumaça vinda do banho quente. Quando por fim enxerguei algo através do vidro,
seu sorriso me convidava a entrar. Subitamente todas as críticas foram embora. Cá
estou eu, surpresa como sempre.