No meio de tanta loucura, pressa e falta de sentimento, criei um único lugar onde algo faria sentido,pelo menos para mim. Um lugar para confortar e acolher pequenas idéias e grandes sentimentos, embora a indiferença de muitos.

terça-feira, novembro 15, 2011

Olá,


                Um dia parei para observar as flores. Um costume que havia perdido por alguns dias, devido ao corre-corre da semana.  Passando por aquele mesmo jardim de sempre, me ocorreu um fato curioso, mas não menos corriqueiro. Tudo estava normal, parado, exceto por um casal. Aqueles dois me chamaram atenção. Resolvi comprar uma pipoca, daquelas de micro-ondas que se compra quando vamos ao circo e as crianças jogam nos outros ou acabam derrubando. Sentei e observei. Nada mais me importava. Tomei-me por completo interessado naquele casal.
                Eram peculiares e inexatos. Uma coisa estranhamente estranha. Aquele tipo de casal que não desce na goela, que não se faz. Que dói na vista. Era o tipo de cara desengonçado que deixa o refrigerante cair na calça branca e ainda diz “não dá pra perceber.” Ela, um pouco mais meiga, simples. Aparelho, óculos grande, sorriso aberto, meio tímido, e livros a mão. Uma clara amante dos livros – talvez os amasse mais do que a ele. Ele, ainda por completar, usava cadarços soltos, pisados. Roupas largadas. Magro, não sei se de fome ou de opção, e alto. Os dois faziam um típico casal que, num zoológico, seria confundido com os flamingos.
                Deixei de lado meu humor crítico. Resolvi observá-los mais a fundo. A moça estava nervosa. Tremula um pouco. Os papéis ameaçaram voar de suas pernas e o rapaz segurou-os. Acho que foi a primeira vez que tocavam nas suas pernas. Ela se assustou deveras.
                Me distrai por um momento com um garoto que tomava sorvete e, por motivos sobrenatural que desconheço, havia deixado a delícia de morango cair. No momento seguinte em que voltei os olhos para o casal de flamingos... perdão, de jovens, ele estendia sua mão para ela. Ela segurava seus livros, e estava indecisa. Contudo, seus olhos brilhavam, como que deslumbrando uma visão do paraíso. Ela sorriu, sem jeito, deixando seus livros caírem. O rapaz não foi tão ágil quanto da primeira vez. Talvez o sorriso da moça o tivesse desfeito, ou fosse sua expressão rotineira, mas ele estava inerte, abestalhado.
Meio confundida, ela segurou a mão do rapaz enquanto com a outra apanhava os livros. Após longa troca de olhares e risos desengonçados, tais qual o rapaz, e depois de recolher todos os livros e perder alguns papéis para o vento, os dois saíram, juntos, de mãos dadas. E agora sigo o meu dilema, com as mãos meladas de pipoca.
Sou um pobre solterão, frustrado com a vida que não tive. Meu humor, diabólico de certa forma, me faz companhia. Creio que sem isso, não me haveria motivos para rir. Tenho 20 anos de vida e 40 de amargura, sem nenhuma memória que valha a pena.